Cinema
A seção se ocupa das práticas históricas e culturais que envolvem o cinema no espaço transatlântico,...
Durante um longo século XX, da perspectiva do esporte, o espaço atlântico coloca em contato quatro subconjuntos, cada um dos quais com suas características específicas: Europa, África, América do Norte e América Latina. Nas últimas décadas do século XIX, instaura-se um verdadeiro comércio quadrangular feito de transferências, de contra transferências e de imperialismo cultural, com seus efeitos bumerangue e seus processos de aclimatação, de adaptação e de reformulação. Tais movimentos são responsáveis pela circulação permanente de práticas, de representações e de pessoas.
Diversas abordagens podem ser vislumbradas: de um lado, partindo das sociedades de origem, de outro, em função dos diferentes esportes analisados e, por fim, concentrando-se nos aspectos, nos mecanismos e nas modalidades desta circulação.
Se nos situarmos da perspectiva das sociedades produtoras de novas práticas esportivas – a Inglaterra vitoriana com o futebol, o rugby, o críquete, o boxe, o polo; os Estados Unidos com o basquete, o voleibol, o beisebol; a Europa, de modo mais geral, com o movimento olímpico – a análise contribui para esclarecer as causas e as modalidades de um imperialismo cultural que nunca foi deliberado, ao menos no que diz respeito aos dois países acima evocados. Isto nos leva a estudar as condições desta transplantação esportiva em espaços e contextos diversos (a África colonizada e em seguida independente; a América Latina na órbita britânica e em seguida americana; o Caribe; os Estados Unidos, que se emancipam da tutela cultural inglesa no século XIX, a Europa do pós-guerra), regidos por múltiplos padrões de dominação (colônias de povoamento, colônias de exploração, império informal, áreas de influência), com especial atenção para os agentes endógenos e exógenos da esportivização das sociedades e para as consequências destas importações sobre as sociedades receptoras. Esta perspectiva analítica mobiliza as categorias colonização, imperialismo, hegemonia cultural e ideológica, aculturação, resistência cultural, construção de identidades nacionais e continentais etc.
Uma abordagem que considere cada esporte individualmente é em parte redundante com essas primeiras considerações, mas tem o mérito de gerar análises mais precisas sobre certos espaços e certas figuras. Pensamos por exemplo no caso particular do desenvolvimento do críquete nas Antilhas, que foi a pedra angular de uma reformulação original, suscitando uma literatura importante e abundante por parte dos defensores da emancipação dos negros (particularmente Cyril Lionel Robert James), mas também em meio à comunidade indígena herdeira das formas de indenture. Figuras importantes são também incontornáveis, com tudo o que representam e revelam dos múltiplos aspectos de um novo comércio triangular: Pelé (do Santos ao New York Cosmos, passando pela Copa do Mundo da Suécia de 1958), Maradona (do Argentinos Juniors ao Nápoles, e em seguida na Copa do Mundo de 1994), mas também o lutador de boxe Mohamed Ali ou o jogador de basquete Michael Jordan.
Por fim, abordar estas circulações transatlânticas a partir de seus mecanismos e impactos permite enfatizar as escalas temporais de médio prazo e ressituar a análise nos contextos econômicos ou políticos que as influenciam. Neste sentido, poderiam ser analisados, por exemplo, os mercados dos jogadores de futebol, com seus momentos de fechamento (do final dos anos 1950 a meados dos anos 1970) ou de aceleração – que dizem respeito aos quatro espaços em questão e que permitem questionar os fenômenos da transição do amadorismo ao profissionalismo, as condições de emergência de espaços especializados na exportação com suas consequências para as sociedades produtoras ou a disseminação do modelo esportivo norte-americano. Outro exemplo seriam as manifestações da Guerra Fria, de suas modalidades transatlânticas (o enfrentamento URSS-EUA no contexto dos Jogos Olímpicos, por exemplo) e de suas eventuais consequências sobre a natureza e a intensidade das trocas neste espaço policêntrico.